quarta-feira, 17 de novembro de 2010

ENTREVISTA: PERGUNTANDO... RAUL VELLOSO @ O capital estrangeiro no Brasil

 

 

 

                Raul Velloso, economista, é  Ph. D. em economia pela Yale University e professor UERJ e ENAP-Escola Nacional de Administração Pública. Foi Secretário para Assuntos Econômicos (1985-89) e Secretário Nacional-Adjunto (1990-91) do Ministério do Planejamento. Foi membro dos Conselhos de Administração do BNDES, Embraer e IBGE. Atualmente é consultor econômico de empresas, bancos, organismos multilaterais e entidades públicas. (Fonte: ABTC)

                Essa entrevista foi realizada em 22/9/10 após sua participação no XI Congresso Nacional Intermodal dos Transportadores de Cargas, da ABTC-Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga, realizado em Natal (Hotel Serhs, com a palestra "Bonança externa, recuperação dos investimentos e retomada sustentada do crescimento econômico brasileiro").

 

 


Otomar Lopes – O Brasil está sendo "invadido" pelo capital estrangeiro. Isso é bom ou é ruim?

Raul Velloso – Eu diria que é muito mais para o lado bom do que para o ruim porque, infelizmente, a economia é sempre assim: quando você tem qualquer mudança ela beneficia uns e prejudica outros. Nesse caso, eu tenho impressão que os benefícios são muito maiores do que os custos que aparecem; é como se a gente dissesse assim: os que ganham podem, em tese, compensar as perdas daqueles que perdem.

 

Otomar Lopes – Na sua apresentação, o primeiro slide diz que "O mundo quer o Brasil, mas o Brasil (setor público) gasta muito mal e, portanto, não quer crescer". È possível mudar essa idéia de não querer crescer ou a "síndrome de Peter Pan" está atingindo o Brasil?

Raul Velloso – Eu que o problema e que nós temos aí um modelo de aumento de gastos e, portanto, da carga tributária em operação – que vem de muito tempo – com os objetivos válidos e não válidos. Os válidos: diminuir a pobreza e diminuir a desigualdade de renda. Os não válidos são aqueles que todo mundo conhece, corporativismo de funcionário, os ataques à chamada "viúva" etc, que a gente vê a todo instante. Mas o problema é que é muito difícil conciliar maior gastos do setor público para esses objetivos com o espaço para investir e atender a esse demanda, e aí vem um conflito, importantíssimo, que se resolve de duas formas: inflação que ninguém quer mais ou através de um posterior encolhimento de quem atende essa demanda gerando a desaceleração da economia via aumento da taxa de juros.

 

Otomar Lopes – Hoje o mundo está "despejando" capital no Brasil, como o Senhor afirmou. É possível o Brasil escolher as prioridades desses investimentos, por setor, ou não é possível obter um capital "seletivo"?

Raul Velloso – Eu acho que nem faz mais muito sentido. O Governo pode ter políticas sinalizando ou até estimulando com dinheiro os segmentos que ele considere prioritários e a sociedade, que ele representa, acredite que isso seja válido. Aí, os capitais que ingressarem, certamente, se encontrarem estímulos financeiros por conta de ação do Governo para aplicar num setor e não em outro, eles se dirigirão naturalmente. Mas não acho que devemos cercear a ação do capital: não combina bem com o posicionamento da economia, do sistema de mercado.

 

Otomar Lopes – Antigamente o dólar era objeto de especulação. Mas era, ao mesmo tempo, uma segurança ou uma garantia de futuro: comprava-se dólar como uma proteção de que, se houvesse um problema, o dólar era a segurança, seja para as pessoas físicas seja para as empresas. O dólar, com essa taxa de câmbio atual, com essa valorização do Real, quando é que poderá se transformar num "mico"? Ou o dólar não será nunca?

Raul Velloso – Olha, eu creio que nunca será um "mico". O dólar está passando por uma fase, vamos chamar assim, de rearrumação das coisas nos países desenvolvidos. Nesse período de rearrumação ele certamente vai se desvalorizar em relação às moedas de países como o Brasil que, no momento, não tem uma razão conjuntural para se rearrumar. Nós temos razões estruturais (pobreza etc), mas no momento, na conjuntura, nós estamos operando bem e é natural que o dólar perca valor em relação ao Brasil ainda que a economia norte-americana seja a número um do Mundo e vai continuar sendo a número um. Mas, no momento, nós estamos com uma vantagem, digamos assim, na conjuntura e com isso as pessoas podem estranhar, mas isso não quer dizer que a gente pode jogar o dólar fora, não se trata disso.

 

Otomar Lopes – Então o "Bolsa-Miami" [como mencionou o outro palestrante, Carlos Alberto Sardenberg] está garantido por algum tempo ainda?

Raul Velloso – Eu acho que sim. Eu acho que vai ter muito "Bolsa-Miami", mas é uma pena a gente desperdiçar, em vez de investir na ampliação da capacidade, a gente usar essa nova condição apenas para expandir o consumo, porque isso não acrescenta capacidade de produção ao País.

 

 

 

Otomar Lopes Cardoso Junior

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