A notícia da explosão de vários pagers no Líbano, extraídas as questões
político-ideológica-bélicas (que não entram na lista de meus comentários),
mostrou que o mundo tem suas distopias, inclusive no seu sentido contrário. Em
outras palavras, as rupturas geradas pelas inovações tecnológicas que tendem a
romper com o passado nem sempre conseguem extinguir toda uma história, mas não
para tudo. É bem verdade que depois do computador não faz sentido ter uma
máquina de escrever e depois do carro flex não faz mais sentido ter um carro com
combustível somente à gasolina ou somente à álcool; e assim são vários
exemplos.
Algumas destas tecnologias totalmente ultrapassadas são mantidas com um
conceito comercial criado (não sei por quem) que classifica os itens com
vintage para justificar quem ainda tem um toca-disco, um telefone à disco, uma
máquina de escrever etc; mas, aí é outra história que gera a mesma curiosidade
de uma fita k-7, apenas o tempo suficiente de ser algo interessante
temporariamente, com futuro apenas para quem é bem saudosista ou para quem quer
ganhar dinheiro vendendo os itens vintage.
Mas, o que me chamou a atenção sobre os pagers foi saber que na França eles
ainda são usados! E nada de questão política ou ideológica, é que tem pessoas
que preferem a simplicidade e objetividade do contato por mensagem, com a vantagem
de que quem tem o pager não precisa responder: pode ouvir o bip, ler a mensagem
e simplesmente não fazer nada. Não precisa continuar o diálogo com outra pessoa,
algo impossível com o pager.
Se a gente considerar o universo de celulares e a quantidade de
habitantes na França, a quantidade de usuários de pagers é pouco expressiva,
mas quando a gente descobre que tem 130.000 usuários ativos, isto mesmo, este
mundo todo que utiliza o aparelhinho regularmente, é de se espantar com sua receptividade.
Mais uma curiosidade sobre os pagers? A empresa que tem estes 130 mil clientes
é a mesma que comercializa GPS, que vende bem na França: de um lado a
tecnologia avançada dos GPS e de outro a tecnologia ultrapassada dos pagers em
uma mesma empresa. Se a gente considerar que negócios são negócios, do ponto de
vista comercial fica tudo explicado.
Não sei se no Brasil alguém ainda usa pager. Acho que não, em geral
somos muito preconceituosos socialmente, em especial quanto ao uso de gadgets e
tecnologias que não consigo imaginar alguém sair na rua ou ir a um bar ou
restaurante com o seu pager “bipando” em vez de ter um celular! Se bem que, ano
passado fui ao interior do RN e encontrei uma loja de celular vendendo aqueles
aparelhos “pé duro”, que tem apenas as teclas com os números e nada de Whatspp,
internet ou aplicativos: é o telefone-raiz, aquele que é usado para ligar e
receber chamadas. Nada mais do que isto.
O mundo é disruptivo e as tecnologias mostram que isto acontece cada vez
mais rapidamente. Pager por lá no mundo rico e moderno e celular-raiz aqui no
interior do RN mostram que as desigualdades existem. Acho que lá compram os
pager por teimosia dos franceses enquanto aqui acho que é uma questão meramente
econômica; bem que gostaria que aqui também fosse por simples teimosia.